
Vacina da gripe produz menos anticorpos em idosos
07/02/2013
"Vacina da gripe produz menos anticorpos em idosos
Segundo estudo, quando envelhece, o corpo reduz a resposta à imunização contra o influenza.
A situação aumenta a vulnerabilidade ao vírus
MARCELA ULHOA
Durante o inverno, período em que acontece as tradicionais epidemias de gripe, cerca de 5% a 15% da população mundial é infectada. De acordo com dados do Ministério da Saúde, são de 3 milhões a 5 milhões de casos graves por ano, e de 250 mil a 500 mil mortes no mundo, sendo que as principais vítimas são idosos e portadores de doenças crônicas. Apesar da redução de casos fatais, principalmente pela disseminação e pela ampla cobertura da vacinação, ainda existem desafios para aumentar a eficácia da imunização contra o vírus influenza. E o gargalo está exatamente nos extremos das idades - nos recém-nascidos e nos idosos.
Em um estudo publicado na edição de hoje da revista Science Translational Medicine, pesquisadores da Universidade de Stanford, nos EUA, mostram que as diferenças relacionadas à idade do sistema imunológico podem afetar a forma como o corpo responde à vacinação. Os idosos, no caso, apresentam uma menor diversidade no repertório de anticorpos. É como se eles tivessem menos armas para lutar contra o vírus da gripe mesmo após a vacina. O resultado veio após a análise de amostras de sangue de 17 indivíduos, divididos em três grupos etários: de 8 a 17 anos, de 18 a 30 anos e de 70 a 100 anos. Todos receberam a imunização contra a influenza sazonal em 2009 ou 2010.
A partir de uma tecnologia de sequenciamento de DNA, os pesquisadores fizeram uma espécie de contagem dos linfócitos B presentes em cada voluntário no auge da resposta imune. "Notamos uma diferença significativa na composição dessas células de acordo com a idade. Pessoas com mais de 70 anos têm um número reduzido de diferentes tipos de células B", explica Ning Jiang, um dos autores do estudo. Segundo ele, a análise de gêmeos geneticamente idênticos possibilitou um controle ainda mais apurado dos dados, pois a semelhança perfeita nos genes não se configurou em um mesmo repertório de linfócitos B e T, células ligadas à resposta imunológica.
Além da menor diversidade no repertório de anticorpos, os cientistas constataram que as células B dos idosos apresentam um maior nível de mutação para os genes codificadores de seus anticorpos quando comparados às demais faixas etárias. O mecanismo pode prejudicar a qualidade das células de defesa que ainda serão produzidas em caso de invasão de um organismo estranho. "As pessoas que respondem pior à vacina são justamente as que mais precisam dela. É um ciclo, o indivíduo responde mal à doença, que se torna mais grave nele. E é justamente nesse grupo que as vacinas têm as menores taxas de eficácia", ressalta Renato Kfouri, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
Mistérios do organismo
Quando uma pessoa saudável é vacinada, o sistema imunológico mobiliza todo o conjunto de defesa. Uma das armas mais utilizadas é o anticorpo, molécula cujos genes são codificados pelos linfócitos B. Durante o acoplamento com o vírus enfraquecido usado na vacina, os genes de codificação de anticorpos podem sofrer alterações que ajudam o sistema imunológico a ajustar a precisão e a eficácia dos ataques. Nesse momento, as células B, que são capazes de produzir as armas mais eficazes contra o invasor, têm a oportunidade de expandir em número. "Em menos de 10 dias, o sistema imunológico do corpo é capaz de evoluir para gerar e ampliar populações dos linfócitos. Esse é um processo incrível, mas nós ainda não o entendemos completamente", pondera Jiang.
Hoje, a medicina coleciona um sólido conhecimento do agente causador de praticamente todas as doenças, mas pouco avançou no entendimento daquele que adoece. É o que defende Renato Kfouri. "Por que uma criança que tem uma meningite morre em 12 horas e a outra é capaz de sobreviver tendo recebido o mesmo tratamento? Por que uns ficam com sequelas e outros não? Ainda é pouco compreendido o papel do sistema imunológico nessa interação entre o micro-organismo causador de doenças e o hospedeiro", explica. Para o médico, o mapeamento genético tem ajudado na compreensão desse mecanismo, o que abre portas para tratamentos individualizados.
Segundo Andréa Maranhão, professora do Laboratório de Biologia Molecular da Universidade de Brasília (UnB), um dos pontos mais impactantes do estudo americano é justamente os métodos de bioinformática utilizados para entender a variabilidade do repertório de anticorpos. Maranhão reforça que a pesquisa traz dois entraves na vacina contra a gripe. O primeiro é a própria variabilidade alta do patógeno, que está sempre em mutação. "O outro é a diminuição da variabilidade do repertório de defesa dos sujeitos mais velhos. Dessa forma, pode ser que, em algum momento, a vacina não funcione porque você varia a ação, mas não a reação", diz.
Indicação prevalece
Apesar dos resultados, Ning Jiang, reforça que a vacina continua sendo um importante método de combate à influenza em pessoas mais velhas, sendo eficaz para a redução da mortalidade nessa faixa etária. No futuro, entretanto, a compreensão das diferentes respostas em um nível molecular pode ajudar a pensar novas estratégias de vacinação, com um programa de imunização cada vez mais eficiente. Além disso, o autor reforça que a mesma metodologia aplicada ao estudo pode ser utilizada para analisar outras vacinas contra doenças infecciosas. "Uma vez que nós sabemos como um sistema imunológico saudável funciona, nós poderemos projetar melhores vacinas ou mesmo detectar infecções precoces."
Enquanto isso não acontece, Jiang aconselha aos idosos que, nos primeiros sinais de gripe, reduzam qualquer atividade que possam expô-los ao vírus da gripe. Além disso, eles devem procurar aconselhamento médico o mais rápido possível e não deixar de tomar as vacinas sazonais. Como o corpo leva cerca de duas semanas para construir o repertório imunológico e a vacina tem uma eficácia um pouco menor em pessoas mais velhas, quanto mais cedo vier a prevenção, melhor."
Fonte: Cofen.com
Imagem: Cofen.com